sexta-feira, 20 de março de 2009


ESSA COISA QUE CHAMAMOS DE AMOR

Você me olha: insiste em que eu fale de amor.
Te olho: prefiro dizer do amor.
Você quer que eu diga do nosso,
Eu insisto em falar de todos, os nossos inclusos.

É isso: se vocês todos pensam que tem um só amor, estão inteiramente equivocados.
Há mais amores do que sonham as nossas vãs ideologias.
E não se trata de traição ou descaso; mais do que essas bobagens cotidianas, quero mesmo é falar daquele amor que não descansa, sempre lívido e célere, carnal e místico.
Aquele amor que não desanda e, quando pára é para tomar fôlego. E quando segue é que necessita pódio. E quando ríspido quer temperança. E quando encarna o cão quer ser um anjo.

É isso! Quero somente falar do que sinto, afora do cinto de segurança do minto ou pressinto.
Mas não é totalmente bem isso: acho que o texto ia bem mas de repente pintou algum ranço no instinto. Não que eu não te ame, longe disso. Não, não precisamos de logoritmos desde o princípio; claro que não nem mais queremos diferenciar as folhas de parreira de eva e adão, ainda mais nesse final de verão, né?

Olha de novo: mas você insiste em falar de amor, né?
Olho de volta: então não se aclame ou sossegue, mon coeur, meu amor, meu bem, ma femme.

É com essa coisa, aquela, da qual a gente foge e persegue, com que você quer você brincar?
Aquele troço que nos alça como bailarinos, acima do olimpo. E depois nos faz resto do mais rés-do-chão do botequim mais pé sujo, do cais mais imundo, da mais fétida noção de futuro que possamos vislumbrar. E no entanto no dia seguinte ao torturo a alma e o corpo desgramados se ressuscitam feito afrodites e lázaros.
É com isso que você quer jogar? Então te digo: a máfia do amor é mais possante e poderosa do que a norteamericana ou siciliana. E geralmente, como no congresso nacional brasileiro, tudo acaba em pítiça.
Mas sendo assim, vá lá. Ou venha cá. Ou nem se mova, mãos ao alto que este mero escrevinhador vai falar:

Eu amo gentes de olhos claros e escuros; pessoas de ancas vastas e esguias; criaturas de todas as cores e estaturas.
Eu amo animais de crias e àqueles perdidos nas ruas; florestas fartas de águas e desertos plenos de secura.
Sou um vagalume, flanando entre o negrume e o radiante;
sou o giz feito carvão, sou na pérola negra o diamante;
e toda vez um risco, arriscando em esplendor ou escuridão.

Eu sou raro e comum como um animal em extinção
Eu sou efeito e fato feito o mineral e a radiação.
Eu amo o mundo como ele é
E a vida que prossiga
Além de mim e de você,
Nós que sabemos o que já fizemos
E que ninguém não mais nos diga ou siga.

Não vou discutir se riso é marfim
ou se choro é ébano.
Não estou afim.
Não estou nem aqui
há séculos.


marco/19.03.2009.

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